Posts tagged ‘Carlos Alberto Machado’

30/08/2013

O Gato lido no Brasil

por cam

UMA BREVE VISITA AO GATO VISITADOR, de Carlos Alberto Machado, por Wellitania Oliveira

Vinda do outro lado do mar chegou a minhas mãos uma caixa cheia de livros. No meio dos livros “O Gato Visitador”, não um gato qualquer, mas o gato que acompanha o poeta Carlos Alberto Machado. Um gato atrevido, de ideias formadas e, ao mesmo tempo, submisso à pena do poeta.

A escritora Roseana Kligerman Murray disse certa vez que “Gatos são poemas ambulantes”, por não entender muito de gatos, não percebi, no momento, o significado desta frase, mas ao ler os poemas de Machado, tive uma clarividência do que ela podia representar.

Não quero aqui explicar a poética de Carlos Alberto Machado, da mesma forma que ele (o poeta) também não tem por que justificar sua criação. Quando muito, podemos sentar à mesa com os amigos e teorizar, ou revelar aspectos e intenções implícitos em seu processo criativo. Por isso, atrevo-me a tecer alguns comentários sobre o gato acompanhante do referido autor.

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16/08/2013

Entrevista dada a António Rodrigues (Ípsilon)

por cam

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Ípsilon, Sexta-Feira 16 de Agosto de 2013.

 

 

 

 

16/08/2013

Ípsilon: crítica a Hipopótamos

por cam

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Ípsilon, Sexta-Feira 16 de Agosto de 2013.

 

 

27/08/2012

Portugal Zero, Brasil

por cam

Lido ontem no blogue da editora Oficina Raquel, do Brasil: «A editora Oficina Raquel afirma-se cada vez mais como uma grande divulgadora da literatura portuguesa no Brasil. No contexto do Ano de Portugal no Brasil, que terá início em setembro de 2012, a Oficina editará quatro títulos. (…) Os outros dois títulos são de poesia: Carlos Alberto Machado e João Luís Barreto Guimarães, destacados poetas portugueses, dão continuidade, nos primeiros meses de 2013, à coleção Portugal 0, coordenada pelo editor da Oficina e também professor de literatura portuguesa da UFF Luís Maffei. Desde 2007, Portugal, 0 edita no Brasil nomes destacados da poesia portuguesa recente, e já lançou, desde então, cinco títulos, o último dos quais dedicado à poesia do exitosíssimo valter hugo mãe. A coleção é sinal de que a Oficina Raquel se interessa pela literatura portuguesa há mais tempo que uma moda. Os livros editados no contexto do Ano de Portugal no Brasil pela Oficina têm apoio da DGLB, Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas.»

03/08/2012

A solidez da oficina e não só

por cam
Do Cabrita, com a mais do que devida vénia:
« Mais um “quatro estrelas em cinco” foi atribuído a um livro meu, na curta mas bem dominada crítica de Hugo Pinto Santos ao meu livrinho de contos Ficas a Dever-me uma Noite de Arromba. Pode ler-se aqui .

O que importa registar é que com tal acumulação de “quatro em cinco” nos últimos anos eu devia viver na Califórnia e ter dois dobermans no jardim. Prescindo bem da Califórnia. Mas já mói o que Hugo Pinto Santos repara no seu texto: «Poeta, ficcionista, ensaísta, António Cabrita editou (só em 2011) um título em cada uma das áreas, respectivamente Não se Emenda a Chuva, O Branco das Sombras Chinesas (outro “quatro estrelas em cinco”), e Respiro (faltaria aqui o meu romance no Brasil, nomeado para finalista da Telecom, e que vai ser editado pela AbYsmo). Que essa produção tenha sido acolhida com um silêncio quase total, eis o que se pode lamentar ou tentar inverter.» Não há nada a inverter. Não creio que Portugal possa ser um país menos mesquinho, menos desatento, menos cretino, mais justo do que é. Vejo as dificuldades com que o Carlos Alberto Machado vive no Pico, sendo talvez o dramaturgo da sua geração, e com a gaveta cheia de excelentes inéditos de ficção que não consegue colocar, vejo como rebolam todos agora diante do Rentes de Carvalho quando o silenciaram durante décadas e só porque felizmente agora o Rentes agora publica numa editora que conquistou uma boa relação com os media (se os “mesmos livros” do Rentes saíssem, por exemplo, na Afrontamento permaneciam no mais absoluto limbo), vejo como o Grabato Dias, um génio, continua a ser absolutamente desconhecido, sem que ninguém morra de vergonha por isso, vejo como o Manuel da Silva Ramos, uma das maiores imaginações-em -acto que conheci na vida (e já conheci algumas) continua a ser menosprezado, vejo como o Paulo José Miranda, o primeiro Prémio Saramago, e um talento total, tem tido uma carreira absolutamente acidentada apenas porque editou os primeiros livros na Cotovia, editora que nunca acolheu as preferências dos media apesar dos bons livros que editava, vejo como o Henrique Fialho continua sem editora para a sua produção profícua e inteligentíssima – e sei: nada há a esperar de um país cujos azimutes são subterrâneos. Até ao fim de ano tenho mais dois livros para sair, dois em Moçambique: «Para que Servem os Elevadores e outras indagações literárias», ensaios, pela Alcance, e «Inventário de Todos os Passos em Falso», uma antologia poética, também pela Alcance. E preparo, com essa excelência oficinal que o Hugo Pinto Santos me atribui, e cito: «Estas ficções de ambiência moçambicana, com personagens de carne e osso, distinguem-se pela disciplina da frase e pela boa gestão dos recursos à disposição – “O mar é o grampo que segura aquela casa de madeira à duna”. Dir-se que “grampo” é a palavra chave mas a chave deste como de outros achados de António Cabrita está antes na solidez da sua oficina, e não em qualquer truque isolado». Fico contente que ele note, que por detrás da transparência da escrita as articulações sejam sólidas. Ainda que pense que esta mesma solidez seja o que assusta quem prefere silenciar-me. Não tem mal, com a consciência oficinal que adquiri e a certeza de uma grande disciplina no trabalho sei que preparo para o ano que vem uma fornada de “cinco em cinco”, porque quando se persiste e não se deixa o talento à deriva é natural que as coisas cresçam. Vai ser tudo publicado no Brasil. Portugal que se foda. Entretanto, chama-me a Jade da banheira: «Bela Adormecida, chaleira…» (em Moçambique não é líquido que os elevadores ou os termo-acumuladores funcionem), e repisa, visto que não lhe respondo logo, «… então, Bela Adormecida, a chaleira…». Tenho uma filha de cinco anos que me chama – por carinho, não por desrespeito – Bela Adormecida. Melhor coisa não há… é isto e a escrita. »

20/07/2012

para o miguel f.

por cam

Hoje um amigo reencontrou-me tropeçou em mim

num livro meu na fnac e foi sentar-se à sombra

de um corredor e leu as minhas estórias e disse-me

isso mesmo com umas palavras hesitantes no gmail

e a alegria que senti não foi além de uns pontos

de exclamação em socorro da memória atrapalhada

 

foi pelos inícios dos anos oitenta na assírio & alvim

da estação da cp do rossio em lisboa onde poetas

se afadigavam na procura dos corpos e os comboios

para sintra os levavam aos ombros macios dos começos

foi aí na a&a que todos os dias cavalgávamos os livros

e depois subíamos ao bairro pelas escadinhas do duque

 

foi lá que perdi memória outros perderam só a noite

ou uma espécie de insensibilidade dura os salvou

eu continuo a voltar sempre um dia antes do outro

sem que os fios da memória se fixem de uma vez por todas

eterno recomeço que apenas a espaços se parece com a vida

mas o teu email querido miguel cravou fundo uma estaca

 

não sei se amanhã daqui a horas ou dias desaparecerá

essa pele que agora parece a dos meus vinte e tal anos

as páginas novas dos livros novos as linhas dos rostos

que afloram à tona do dia os pequenos gestos tão sós

os sentimentos sem corpos os lugares desocupados

como as palavras que sem sabermos nos mentiam

 

ah se eu soubesse então que as minhas palavras futuras

teria também de as varrer do sarro que nos outros eu via

crescer disfarçadas com o rancor a romper as lantejoulas

tão fácil que era passar pontes a voar e sorrir de lábios

rasgados e a dor a ficar aninhada numa puta do gingão

ou num banco de jardim na madrugada fria do cais

 

havia muito aço frio naquela maldita estação do rossio

e não sei se terá ficado estes anos a embotar o espaço

e o tempo que se espraiam entre os que se davam

 

o certo é que morreram alguns de nós

toupeiras inúteis.

14/03/2012

DIA DA POESIA

por cam

Dia Mundial da Poesia, no CCB, onde participarei (24 de Março, todo o dia).

[ ver aqui o programa completo ]

27/01/2012

MAGMA EXPULSA E LEMBRADA

por cam

POR VAMBERTO FREITAS

“Cada texto foi inscrito com o seu valor próprio e com os decorrentes de cumplicidades, atracções e repulsas – tensões próprias de uma revista com identidade irrepetível.”

Carlos Alberto Machado, Coordenador da extinta revista Magma

«As palavras de Carlos Alberto Machado, um dos fundadores e coordenadores da (extinta) revista literária Magma, referem-se ao número zero de lançamento publicado pouco antes, e havia já chamado a si um diversificado grupo de escritores, uns mais conhecidos do que outros, residentes nos Açores e no Continente. Depressa esse rol de colaboradores aumentaria consideravelmente, Magma abriria as suas páginas à nossa diáspora, desde os Estados Unidos e Canadá ao Brasil, assim como a participantes de outros de países, alguns deles naturalmente em tradução. A edição inaugural incluía ainda uma separata de poesia, que se publicaria com outros dos seguintes sete números, cada uma coordenada por um escritor ou poeta convidado/a, tal como a revista no seu todo até ao seu abrupto desaparecimento em 2008. Estava assim lançada em 2005, a partir da Câmara Municipal das Lajes do Pico, sob a direcção também de Sara Santos, uma das melhores publicações de “criação literária” nos Açores, tendo como única companhia no arquipélago a NEO dirigida por John Starkey e com a chancela do Departamento de Línguas e Literaturas Modernas da Universidade dos Açores, mas mantendo uma autonomia editorial absoluta.

É certo que revistas ligadas aos nossos institutos culturais na Horta, em Angra do Heroísmo e Ponta Delgada sempre serviram como outras “universidades” da nossa classe culta, privilegiando a investigação história, sociológica e literária, mas só nestes últimos anos publicações como a Magma e a NEO davam continuidade ao que muito anos antes iniciara A Memória da Água-Viva, sob a direcção de José Henrique Santos Barros e Urbano Bettencourt a partir de Lisboa nos anos 70. Todos estes projectos tiveram ou têm características editoriais muito próprias: o diálogo literário implícito inter-geracional, colocando escritores de nome feito ao lado dos mais novos, estes sempre em busca de meios para chegarem a um público leitor na sua sociedade e, quando possível, para além dos horizontes regionais e nacionais. Ainda hoje as little magazines, assim chamadas nos EUA pelo seu formato livresco em que a criatividade visual quase sempre faz parte da sua originalidade e distinção, constituem (sem que a net as ameace, por enquanto) as mais procuradas publicações pelos que buscam sistematicamente a inovação ou as novas tendências literárias em qualquer língua. A Orpheu em Lisboa (Fernando Pessoa) e depois a Presença (José Régio, Casais Monteiro e João Gaspar Simões) em Coimbra foram para a nossa literatura o que The Paris Review ainda hoje representa para os norte-americanos: estar presente em qualquer uma das suas edições é ficar consagrado ou, no mínimo, apresentado a leitores de maior exigência literária e cultural.

Magma cumpria por inteiro a missão literária inerente a estes projectos. Olhando a vasta lista de participantes na suas páginas, nota-se de imediato a presença da maior parte dos nomes açorianos associados à nossa nova geração de escritores em convivência de igualdade sem apologias com alguns dos autores mais conhecidos e prestigiados em Portugal, desde Alberto Pimenta, Ana Hatherly, Ana Martins Marques, Manuel de Freitas e Gonçalo M. Tavares a outros de língua portuguesa como Luiz António de Assis Brasil e Lélia da Silva Pereira Nunes (que coordenaram um dos números da revista, levando alguns escritores brasileiros a ficcionarem os “seus” Açores, alguns deles nunca tendo cá estado). Da diáspora, uma vez mais, para além dos emblemáticos Onésimo T. Almeida e Francisco Cota Fagundes, aí está Frank X. Gaspar cuja obra em parte comemora a sua ancestralidade picoense, tendo merecido uma separata por mim traduzida sob o título de um dos seus poemas, A Noite dos Mil Rebentos. Não serão, no entanto, os nomes, por mais famosos que sejam na literatura nacional (nacional aqui inclui os Açores e os açorianos, naturalmente) ou estrangeira, mas sim porque a Magma passou a constituir, na sua relativamente curta existência, outro grande repositório da nossa memória colectiva, o que mais interessa sempre na escrita em qualquer uma das suas formas criativas ou ensaísticas, já para não falar no estímulo ao trabalho entre os que, apesar do seu inegável talento intelectual, raramente encontram um meio de divulgação da sua obra incipiente ou já legitimada quer pela comunidade quer institucionalmente. Para uma região que sempre se demarcou a nível nacional pela sua criação ou produção literária, mas sofre do provincianismo reinante e da lonjura das sectárias máquinas editoriais e de favores sem fim da nossa capital, só iniciativas como esta garantem a dignidade cultural do nosso povo, asseguram para as gerações vindouras os arquivos artísticos da sua própria ancestralidade geográfica, histórica, intelectual. Quem acha que isto tem importância menor, como parece ser o caso entre nós neste momento, esquece-se que a desmemória colectiva é bem-vinda e essencial à já reinante ditadura pós-moderna, ao novo fascismo engravatado que se auto-denomina de Mercados e nos corrói a todos. Um povo sem a sua voz fica coisificado e apto a ser manobrado por todos que o querem na condição de escravo. Por outro lado, a descentralização da cultura é também já um facto notável em muitos países avançados, os centros estão a virar margens ou a evoluir para comunidades de interesses outrora totalmente dominantes a partir dos grandes espaços ou cidades. Cada sociedade terá agora de garantir os seus próprios meios para se afirmar e se auto-afirmar perante os outros que partilham ou não o nosso destino. No que se refere a publicações deste género e ao diálogo a um nível superior sem nunca deixar de incluir quem deseje participar, não poderemos colocar no fim das prioridades dominadas por supostas manifestações de “cultura” no que entre nós passaram a ser festas instantâneas, com muita perna pimba e vozes sem talento em palcos estupidamente improvisados á beira-mar – a um custo, para os nossos cada vez mais limitados recursos, avassalador e cuja destruição maior tem sido também a marginalização e amordaçamento dos tradicionais rituais festivos nas freguesias rurais de todas ilhas.

“A NEO — escreveu Urbano Bettencourt no número três (2006) da Magma, por ele coordenado — publica-se em Ponta Delgada e fica muito bem aí mesmo; A Magma publica-se nas Lajes do Pico, que não são a capital ou ex-capital de coisa alguma, não têm uma ilha em frente, embora sejam o lugar de onde é possível ver a Montanha nascer das águas, como Vénus. Quer dizer, a Magma também fica muito bem onde está, sem complexos de lugar, pois, como afirmava o escritor cabo-verdiano Manuel Lopes, a partir da Horta e em meados do século passado, o pior que pode acontecer a um lugar pequeno é ser, simultaneamente, tacanho”.

Magma, pois, pela sua inquestionável qualidade em cada número publicado e pela sua abrangência de temas, geografias dos nossos afectos e estilos, prestigiava como poucas outras publicações nossas a literatura dos e nos Açores. Que partia de uma pequena vila açoriana fora do triângulo do poder político regional só lhe trazia um estatuto que em Portugal será difícil de encontrar, habituados que estamos às falsas e moribundas grandezas dos “grandes” centros. Não deveríamos esquecer que a grande tradição intelectual e criativa das nossas ilhas – não sou o único a afirmá-lo — tem a sua primeira base na página impressa, quer se trate de livros, jornais ou revistas, precisamente os meios mais ignorados cá nos tempos que correm.

Magma ficará arquivada e citada por muitos outros como testemunha do trabalho intelectual sério e universalmente identitário. O resto e os autores do nada irão cair irremediavelmente no muito merecido esquecimento.»

________________________

Magma (2005-2008), fundada e dirigida por Sara Santos e coordenada por Carlos Alberto Machado, Câmara Municipal das Lajes do Pico, Pico, Açores.

Texto publicado hoje, Sexta-Feira 27 de Janeiro, no Açoriano Oriental e também no blogue de Vamberto Freitas.

 

18/01/2012

HAMLET & OFELIA VOLTAM A ATACAR!

por cam

«Conheço há muitos anos o Hamlet e a Ofelia. Estes ou outros. Sempre diferentes na sua fuga pelo mundo. Morrendo e ressuscitando sempre. A primeira vez que os encontrei foi em África. Bissau. Mercado a céu aberto do Bandim. Ele esgaravatava dos bolsos uma decrépita nota de franco para um quarto de uma Sagres escaldante. Ela à beira da estrada mijava sangue. E os seus olhos pediam a compaixão de uma morte breve. Mais tarde, Lisboa. Pensão Paraíso (“Banhos Quentes e Frios”). Ofereceram-me os seus corpos esvaziados em troca do que eu quisesse. Encontrei-os ainda no Kosovo. Klina. Brigada portuguesa. A guerra tirara um braço a Hamlet. A Ofelia a cor da pele. Nada tinham que servisse de moeda de troca. A última vez foi em Nova Iorque. Foram eles que comandaram a destruição das Twin Towers. Foi essa a história que me quiseram vender e que eu não comprei. Preferi ser eu a inventar-lhes uma outra vida. A troco de nada.»

[ a minha peça está editada pela Escola Portuguesa de Moçambique (2008) e em Kindle/Amazon – e este é o seu texto de “apresentação”… ]

16/01/2012

A VIDA DEIXA MARCAS NA ESCRITA

por cam

Recordo com gosto um jantar no restaurante D. Luís, em Campolide, quando o Manuel e a Inês juntaram os escribas dos primeiros livros da sua novíssima editora Averno: o Rui Pires Cabral (Praças e Quintais), o Rui Caeiro (Olhar o Nada, Ver a Deus) e eu (A Realidade Inclinada). Isto foi em 2003.

Na Averno seguiram-se muitos mais livros e escribas.

Entretanto, eu deixei o bairro e o convívio com alguns amigos.

E a Inês publica agora o seu primeiro livro de poemas: Em Caso de Tempestade Este Jardim Será Encerrado (Tea For One, 2011).

Escrever sobre um livro – coisa que faço poucas vezes e apenas sobre autores com quem tenho afinidades de alguma natureza –, resulta de uma vontade que tem semelhanças com a que me leva a criar as minhas próprias coisas. São diálogos, declarações de gosto, cumplicidades (embora deva admitir que algumas possam não ter retorno). Não são críticas – muito menos este texto –, embora eu não tenha por princípio nada contra a crítica (os contextos e os modos como se exerce são outras questões, que não vêm agora a preito).

Na minha primeira leitura deste livro da Inês fiquei com a impressão (essa coisa boa que tantos desprezam em público e cultivam em privado) de ser uma jornada de vida em que a sua voz poética, serena e contida, pontua momentos de vida da mulher Inês, mas, igualmente, a da poeta Inês, coisa, aliás, que reciprocamente se contaminam, ora de forma pacífica, ora em justas dolorosas. Creio que todos os livros de poemas são isso e apenas isso, uma maneira singular de cada um se inventar, nunca a partir de um nada impossível, mas num jogo de intermináveis passagens entre estados, naturezas, visões, desejos.

Uma primeira obra nunca é a primeira, pois resulta de sucessivos livros primeiros que se escrevem noutras zonas do ser (e sem essa escrita, essa sim primeira, não haveria “primeiras obras”). Por “razões” que nem imagino, a “primeira obra”, aquela de que saboreia as palavras impressas – visualmente, pelo tacto, pelo cheiro, pela manipulação das suas folhas – poderá ser o primeiro e único livro da vida do poeta, por vislumbrar que nunca mais poderá vir a escrever outro – porque nesse primeiro se esgotou, ou porque é preciso que a vida aí termine (o poeta nada mais tem a dizer, aquilo que ele é está nesse último – embora aparentemente primeiro – Livro.) Se o poeta atinge aquilo que quis alcançar, possuir-se a si mesmo na obra que termina, para quê continuar? Se não se possui, deve, então, saber esperar.

Continuar – a escrever – é viver no futuro, com um presente indesejado, incompleto. Poucos poetas conseguiram parar. Continuam(os), diz-se, a escrever sempre o mesmo livro. Prova de incompletude, será. Nunca coincidindo com o Outro que sabemos ter em nós. Divididos. Separados.

Porque digo estas coisas quando dialogo com o livro da Inês? Não sei, mas devo aceitá-lo (e quero partilhá-lo), porque sei que o sinto e o escrevo pelo livro dela – e pela mescla insondável de outras coisas que momento a momento nos fazem, infelizmente (ou talvez não). Nem os poetas sabem bem como separar os ingredientes da vida. Pois seja.

A Inês é uma pessoa amável e gentil. Mas isso não a impede de saber como perscrutar os escaninhos da sua, da nossa, via dolorosa – e de os expor à luz, que a uns acicata desejos, a outros o júbilo do fim. A jornada neste Jardim da Inês começa, canonicamente, pela Rua da Infância. Nela, há uma “rua estreita” que lhe “parecia só acabar no mar / no mar.” Mas, “se olhar / mais demoradamente” já sentirá o “sol a queimar o futuro”. Cinco anos é uma boa de idade para aprender que as palavras nunca se hão-de separar de nós: “Quando ela me cravou um lápis / sob o olho esquerdo, pressenti que a escrita, / grafite fria à flor do sangue, / deixaria marcas para sempre.” – “ela” foi a Ágata, “cabelo em forma de pássaro – negro / asa de corvo.”

A vida deixa marcas na escrita. Nesta escrita, o desencantamento, uma melancolia, associada à noção de perda, vai ganhando corpo. A falha é muitas vezes encarada como um espinho que acirra a desistência, mas também pode levar a uma exposição serena da dor. Espera fria e rigorosa. A escrita da Inês não apela ao sobressalto existencial – se, “em caso de tempestade o “jardim” tiver de ser “encerrado”, creio que ela olhará uma vez mais a pena branca da “colomba ferita” entre a vegetação e caminhará, serena e firmemente para a saída mais próxima.

Um “morto fica mais só”, mas “Os mais sós, afinal, são sempre os sobreviventes.” – “pago para fugir / à morte, escolhendo trajectos que me façam doer / todos os músculos, excepto o do coração.” Num “dia / em forma de pássaro morto”, a uma “indiferença cansada” prefere “a do outro pássaro que, lá muito em cima / (…) refaz a traços negros / a vida. É por esses instantes / de voo que aceito continuar a perder.”

“No fundo, é isto: espera-se.” / Escrevemos incuravelmente / a história dessa espera, mas / nunca se chega ao fim da rua, / mais escura do passado, / nem se despe por completo o luto, / sempre outros os mortos, sempre igual a si / a morte. A espera, // essa continua.”

O tipo singular de desencanto que atravessa a escrita da Inês pode ter este paradigma (de “Cemitério dos Prazeres”): “E o amor / [é] um casaco que nos pousam / sobre os ombros, como se isso bastasse / para reanimar o coração / quando tocamos às portas / e ninguém responde.” Mas desencanto não significa necessariamente desistência ou prostração: “Sobreviveremos à demasiada solidão, / mesmo que nenhuma outra porta / se venha a abrir para nós.” (do mesmo poema).

O antepenúltimo poema – dedicado a António Barahona – intitula-se “La Colomba Ferita”. Se ainda se puder usar o adjectivo “belo”, direi que sim, que é o poema mais belo do livro, e também o mais poderoso na sua luz. Na minha leitura, impressionista, direi, então, que é o poema-emblema do livro. É um daqueles poemas de que se pode dizer que “inventa na língua uma nova língua”.

Creio que é melhor transcrevê-lo integralmente:

Quando me cansar de voar ou

a ferida estiver finalmente visível,

promete-me que a faca

será afiada e silenciosa.

Que eu não a veja chegar,

como se não tivesse passado

uma vida a pressenti-la nas dobras

do lençol, mortalha de tantas noites.

 

 E antes, dá-me de beber

entre as mãos, conta-me

de céus azuis, sem garras

e sem abismos. Espera que

o meu coração de novo pequenino

se aninhe no calor das tuas veias

e se torne apenas a memória de

um sobressalto contra a tua pele.

Por este livro, por este poema, regresso a Campolide.

12/01/2012

BOTEM OS HOLOFOTES SOBRE O GAJO

por cam

Já tentei chegar à coisa de várias maneiras, a menos má é esta: Botem os holofotes todos sobre o gajo que dá pelo nome de António Cabrita e está no Alto Maé, Maputo, Moçambique, mais a Teresa e as suas três meninas! Um gajo agarrado ao tutano da terra e a viver noutro espaço-tempo. E faz disso escritura como pouca se faz no mundo que eu conheço. Pronto, está dito.

Ando às voltas com o Respiro dele (edição Língua Morta, Lisboa, Novembro de 2011 – não saiu em nenhum Top Ten, estejam descansados!). São trinta páginas de texto que pesam como um milhão de anjos (talvez caídos).

Num repente, pode ser assim: o Cabrita convocou Plotino, Koestler, Bosquet, Octavio Paz, Ken Wilber e Shayegan (exemplos maiores) para servirem de pilares e traves mestras para uma casa que ele próprio constrói. Até aqui, tudo bem. Ora, acontece que a casa que o Cabrita quer construir com eles é uma casa que desconcertaria qualquer arquitecto, dos idos e dos vindouros, parece-me, pois tem como principal traço distintivo o de ser uma casa e o seus desdobramentos sem fim. As cobertas não são o que parecem, nem o chão, e molda-se aos pensamentos de cada habitante ou visitante. Mais ou menos, que as palavras parecem estar a ser contaminadas pelas flutuantes terras moçambicanas.

Cabrita evoca o “clamor das contradições” (Plotino), os hólons (Koestler), o “terceiro incluído” (Nicolescu, Lupasco)… para dar umas valentes voltas ao real e à realidade, à referencialidade, ao uso da metáfora e da metonímia, ou não fosse o poeta, na iluminação de Jean Carteret, “o homem mais esburacado do mundo”.

(quando acabei a primeira leitura, só me apeteceu copiar todo o livro, como fez segundo Borges, o Pierre Menard, que “tinha a admirável ambição de vir a produzir umas páginas que coincidissem, palavra por palavra, linha por linha, com as de Miguel de Cervantes” no seu Quixote. Pois.)

Sobre a metáfora, nas palavras do poeta libanês Adonis: «Quando a metáfora encosta à ordem do dizer é porque está degradada e estampa unicamente uma réplica rançosa de um território que a retórica já mapeou – o que hoje, na realidade, acontece à maior parte da escrita e escolas, sem excepção.»

Os hólons, “cabeça de Janus: podem ser vistos como um todo em si mesmo e, simultaneamente, como uma parte do todo maior”, marcam o caminho do Cabrita na primeira parte do ensaio, mas ele faz questão de dizer que não há “hologarquias”, pois há uma diluição de categorias e não um esforço da legitimidade das mesmas – um não à autoridade. A água que sob fervura sobe no alguidar é o território da imanência, seguida de extraterritorialização, e dessa dobra nasce um novo plano imanente e assim sucessivamente. Por outro, lado, sem contradizer isto, mas seguindo-se-lhe, socorre-se ele de Bosquet : «avant l’arbre, il y a le besoin de dire arbre. Donc, la poésie va vers un renversement des hiérarchies.» A escrita vem de fora (Christian Bobin), o aqui e agora que tem no Efeito de Moebius (Pierre Levy) um recurso de uma consciência, corresponderá à Dobra de Fora de Deleuze.

E (simultaneamente), a “intuição de Paracelso: “em cada nível é a mente quem faz ver os olhos” – “e viva a reversão do Efeito de Moebius”.

Na segunda parte, Cabrita ataca a linguagem. Talvez as palavras que pede emprestadas a Octavio Paz digam o essencial: as palavras são elas o “o referente e são tão reais como as árvores, as casas, os aviões as paixões”. Isto porque o Cabrita se deita a falar de “linhagens de poetas”, uma, daqueles que se servem da linguagem como instrumento auxiliar; outra, daqueles para quem a “linguagem é em si mesma um problema, um conflito já existente, uma dobra” – e depois traz à liça o Herberto Helder. De um gag do Bucha & Estica, salta o cinéfilo Cabrita da “terceira mão” do gag para uma “terceira palavra”, a Graça de ser capaz de “aceitar o estranho como parte de nós. A “terceira palavra” é o poeta aceitar uma palavra que não lhe pertence – a instauração do sagrado.

Entro na terceira parte, em que o Cabrita diz que no mundo às camadas – os hólons – quando “ocorre uma passagem de uma para outra camada ocorre uma conversão semiótica”. No interior da linguagem, “a lógica deixa de operar segundo um esquema linear, gramatical, que se duplica na representação do espaço-tempo sucessivo, para actuar segundo intersecções, vizinhanças, constelações, fractalidades.” E diz ele julgar que se localiza “aqui a origem das disparidades que retalham o tecido da poesia contemporânea”

(isto está na página 26, não me apetece fazer ecoar aqui os nomes que povoam o texto).

Interessa-me, isso sim, abrir o peito a balas como estas: o poeta “habita” o “susto da linguagem”, “é uma coisa que se «sofre», e que não se pede ou de que se faça posse”. Esta parte termina com uma citação de Llansol, de Um Falcão no Punho, que talvez pudesse estar como epígrafe geral do ensaio: “Não há literatura. Quando se escreve só importa saber em que real se entra, e se há técnica adequada para abrir caminho a outros.”

(agora devir ficar um ano a reler os livros da Llansol, mas nã’ posso)

Da quarta e última parte quero reter a reafirmação do duplo contra o uno, das simultaneidades contra o plano rasante, dos paralelismos simultâneos contra as univocidades, e assim (percebam que estes “contra” não são bem contra seja oque for…).

Outros “contras”: contra “o patchwork que é a regra que enganosamente nivela o mar das consciências”; contra o “sabor único”.

(agora devir ir trocar as partes todas e reescrever o texto, mas nã’ tenho forças)

Em 2007, a propósito da celebração de mais um Dia Mundial da Poesia, editei uma plaquette com um texto do Cabrita intitulado Que histórias conta o ouriço à baleia? – Travessias no imaginário. Começa assim: “Na Índia, Deus pode criar uma pedra que lhe seja impossível deslocar, e sonhar um sonho do qual não desperte. O que seria uma impossibilidade lógica para o pensamento ocidental. Na filosofia, chama-se a esta impossibilidade lógica uma aporia. Mas não existem aporias na literatura.”

Não sei quantas vezes mais voltarei a este livro do Cabrita, tenho de confessar que sofro de outras perturbações: agora, é com o Carlo Michelstaedter – La Persuasión y la Retórica, edição espanhola – e com o Quaresma, Decifrador, do Pessoa (mas o monte na realidade é maior e a confissão passaria a ser vergonhosa).

Ao fim da terceira leitura, impuseram-se-me os sobressaltos que se seguem:

1 . Um texto também serve para aprender

2 . Um texto também serve para cair num poço

3 . Um texto não serve para saber se o poço tem fundo

4 . Um texto pode ser um poço

5 . Um texto pode (deve?) ser Dois

6 . Um texto vai a meio

7 . Um texto flui como vida

8 . Um texto não existe porque é sempre a vontade de outro texto

9 . Um texto não se possui

10 . Um texto é ponte e travessia.

Respiro, ensaio de António Cabrita, nas edições Língua Morta, Novembro de 2011
06/01/2012

AS QUALIDADES DO MANUEL DE FREITAS

por cam

Conhecemo-nos no bairro lisboeta de Campolide, nos princípios de 2001, tinha eu já publicado os meus primeiros livros de poesia “Mundo de Aventuras” (1999) e “Ventilador” (2000) e o Manuel o, também de poesia, “Todos Contentes e Eu Também (2000). Sem o sabermos, éramos vizinhos. Descoberta a vizinhança, veio a amizade. Partilhámos nesses anos o que é comum dois amigos partilharem, com os gostos comuns da poesia e da boa conversa à mesa vinicamente regada. Sempre, ou quase sempre, com a Inês (que em 2002 publicaria na Colóquio-Letras da Gulbenkian uma recensão sobre o “Ventilador” que ainda hoje me emociona). Tive a felicidade de ser um dos antologiados em “Poetas Sem Qualidades” (Averno, 2002 – a sua editora que publicou também em 2004, o meu “A Realidade Inclinada”) antologia que tanto celeuma provocou (e hoje continua a ser uma obra de referência quando se discute a poesia contemporânea portuguesa & etc… – cf. a minha crónica sobre o último livro do Pedro Eiras: “Um certo pudor tardio. Ensaio sobre os «poetas sem qualidades»”, Porto, Outubro de 2011). Depois, anos mais tarde, as nossas vidas descruzaram-se, com mágoa minha. Tudo isto para dizer (lembrar) que a minha escrita sobre livros está inevitavelmente ligada ao modo como me relaciono com os autores por quem nutro amizade. Não pretendo esconder isso, antes pelo contrário. É assim e ainda bem que é.

Manuel de Freitas (Vale de Santarém, 1972) é, além de poeta, ensaísta, tradutor, antologiador e crítico; dirige, com a Inês Dias, a revista Telhados de Vidro e a editora Averno. Esta crónica surge agora a propósito da antologia por ele organizada, e publicada em 2009 mas que só agora tive oportunidade de ler: “A Perspectiva da Morte: 20 (-2) Poetas Portugueses do Século XX” (Assírio & Alvim). O Manuel usou um critério temporal: poetas nascidos antes de 1950. Os -2 são Joaquim Manuel Magalhães e João Miguel Fernandes Jorge que “preferiram não ser incluídos” (p. 12). “Esta antologia (…) está-se nas tintas para a posteridade. Trata-se de uma viagem estritamente pessoal (…)” (p.10). Li-a – com imenso prazer, embora com as inevitáveis discordâncias –, mas o que me leva a escrever agora são outros aspectos: esta antologia (creio que outras se seguirão), completa, de certo modo, a escrita do Manuel de Freitas – de modo nenhum se trata de um gesto de autoridade ou de sobranceria, como por vezes acontece com certos antologiadores. Não, de todo. Por outro lado, reforça a sua visão do lugar poético, dos seus “fazeres” e da sua relação com o “real”. Não se trata apenas de uma “perspectiva da morte”, mas, de certa maneira radical, olhar para trás e trazer à liça os poetas e as poesias de, digamos, uma linhagem. Antologiar, é, no caso do Manuel de Freitas, cimentar um percurso: as “vozes que tanto me marcaram”, “marca-as” ele retroactivamente. Ambição gratuita? Não.

O Manuel de Freitas é uma das personalidades fortes da poesia e do pensar da poesia hoje em Portugal e creio que o tempo só reforçará junto de quem o lê essa evidência. Uns gostam, outros não. Eu gosto.

O Manuel tem dois ensaios sobre dois poetas maiores (Al Berto, 1999, Herberto Helder, 2001); há quase uma década vem publicando no jornal Expresso (suplemento Actual) as suas recensões críticas: creio que todos ganharíamos em (re)lê-las organizadas em livro. Fica a deixa.

30/12/2011

«ESTOU A PERDER QUALIDADES»

por cam

O Pedro Eiras acaba de publicar Um certo pudor tardio. Ensaio sobre os «poetas sem qualidades» (Porto, Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa e edições Afrontamento, Outubro de 2011). O título diz tudo, desdobrando é mais ou menos assim: os «poetas sem qualidades» são nove criaturas que em 2002 o poeta e crítico Manuel de Freitas reuniu em livro, justamente com o título Poetas sem qualidades (Lisboa, Averno), e são eles: Anónimo, Ana Paula Inácio, Carlos Luís Bessa, João Miguel Queirós, José Miguel Silva, Nuno Moura, Rui Pires Cabral, Vindeirinho e este que se assina aqui, Carlos Alberto Machado. «Um certo pudor tardio» foi retirado de um poema de Manuel de Freitas que integra o seu livro A Nova Poesia Portuguesa (Lisboa, Livraria Poesia Incompleta, 2010). Está feita a apresentação. Agora, visto emprestado um fato de “divulgador”, um pouco enrugado e estafado por falta de uso, feito de mau tecido, acaba por nunca merecer o objecto a “divulgar”, mas vamos lá –

O Pedro – com quem cultivo uma certa amizade à distância, raramente nos encontrámos, desde 1999, no Porto, quando participámos em diferentes oficinas de escrita teatral dirigidas pelo Antonio Mercado, noites de boa memória – o Pedro, dizia eu, lançou-se a (re)ler o livro de Freitas (e os «poetas sem qualidades») para, por um lado, enfrentar o conceito «sem qualidades»; por outro, navegar na análise «interartes», nos domínios da música (Manuel de Freitas), pintura/museologia, fotografia e cinema (vários poetas «sem qualidades», com relevo para o José Miguel Silva). Perspectiva citacional.

Para caber tudo em mais ou menos 2.500 caracteres, direi que o Pedro Eiras se põe às voltas com Musil, com o conceito baudelairiano de modernidade, a que acresce o de presente-contemporaneidade vs tradição, sempre com a questão do tempo à ilharga, para, no fundo, discutir a propositura de «sem qualidades» que o Manuel de Freitas agita na sua introdução ao seu livro de 2002 a partir do prefácio «O tempo dos puetas» (assim mesmo, com “u”). Pede ajuda e conforto a Giorgio Agamben e a Walter Benjamin (sobretudo a este), e dirime com “boas palavras” as coisas. Ah, esquecia-me de dizer que esta démarche se faz ao longo de «13 tentativas para um prefácio». O que o Pedro quer mesmo é saber/indagar, cito, «em que sentido citar é um acto ético. Este ensaio é sobre a citação, as citações.» (11. Proposição, pg. 57). «O que procuro é uma ética.», diz em 13. Ethos (pg. 63). Uma salvação. O final, em jeito de posfácio, é o Pedro a deambular (a flanar) pela «cidade baudelairiana», com Rui Pires Cabral.

Ao “divulgador” fica bem umas “notas críticas”, ofertarei duas pelo preço de uma: há um passeio escorregadio quando o intérprete obriga os músicos a modificarem a pauta, uma; duas: «Um certo pudor tardio. Ensaio sobre os «poetas sem qualidades» introduz uma plataforma de serenidade arredia tanto de consensos estéreis como de guerrilhas inconsequentes.

Resta interrogar as ruínas.

26/12/2011

O TEMPO DOS ASSASSINOS

por cam

Outro projecto que a miopia política assassinou: a revista Magma. Com direcção de Sara Santos e minha coordenação editorial, a revista era editada em regime de “carta branca”. Além de mim, coordenaram números: António Cabrita, Lélia Nunes e Luiz Antonio de Assis Brasil, Judite Jorge e Mário Cabral, Urbano Bettencourt.

Publicaram-se 7+1 números: do zero (Maio de 2005), ao 7 (Dezembro de 2008), com Separatas do zero ao 4.

Participaram nos 7+1 números, dezenas de autores, repartidos pela poesia, conto, teatro, ensaio e tradução, de Portugal (mainland, Açores e Madeira), Brasil, Cabo Verde, Espanha (Canárias) e Moçambique.

Na fotografia aqui à vista, estão as capas dos números zero e 1, com as respectivas Separatas, a do zero com Avulsos por Causa (poesia), de Renata Correia Botelho, e a do 1 À Flor do Mar (crónicas sobre livros), de Inês Dias.

Eis a lista dos participantes da Magma, para “memória futura”:

Abel Neves, Albano Martins, Alberto Pimenta, Alexandre Borges, Alexandre Dale, Altair Martins, Amilcar Neves, Ana Francisco, Ana Hatherly, Ana Maria Fagundo, Antidio Cabal González, Ana Marques Gastão, Ana Paula Inácio, Andes Chivangue, Ângela Correia, António Cabrita, António Godinho, António Olinto, Armando Artur, Carlos Alberto Machado, Carlos Bessa, Carlos Henrique Schroeder, Carlos Nogueira Fino, Carlos Tomé, Carlos Urbim, Carol Bensimon, Celso Gutfreind, CEPiA, Charles Kiefer, Christina Dias, Claudia Gelb, Claudio Daniel, Cleci Silveira, Daniel de Sá, Diego Grando, Dilan D’Ornellas Camargo, Dom Midó das Dores, Eduardo Bettencourt Pinto, Eduardo Nasi, Elis Cruz, Fernando Guerreiro, Fernando Neubarth, Fernando Paixão, Fernando Rozano, Fernando Silva, Ferreira Gullar, Flávio José Cardozo, Francisco Cota Fagundes, Frank X. Gaspar, Gabriela Funk, Gabriela Silva, Gilberto Perin, Gonçalo M. Tavares, Helder Moura Pereira, Hoyêdo de Gouvêa Lins, Inês Dias, Inês Lourenço, Ítalo Ogliari, Ivette Brandalise, Ivo Machado, J. Michael Yates, Jacinto Lucas Pires, Jaime Rocha, Jaime Vaz Brasil, Jane Tutikian, João Almeida, João-Luís de Medeiros, Joel Neto, Jorge Adelar Finatto, Jorge Fazenda Lourenço, Jorge Gomes Miranda, Jorge Louraço Figueira, José Agostinho Baptista, José de Sainz-Trueva, José Eduardo Degrazia, José Luís Hopffer Almada, José Luís Tavares, José Maria Carreiro, José Miguel Silva, José Viale Moutinho, Juan Carlos de Sancho, Judite Jorge, Júlio de Queiroz, Laerte Silva, Laís Chaffe, Leatrice Moellmann, Lélia Nunes, Leonardo Brasiliense, Lúcia Helena Marques Ribeiro, Luciana Veiga, Luis Carlos Patraquim, Luís Dill, Luís Filipe Borges, Luiz Antonio de Assis Brasil, Luiz Paulo Faccioli, Maicon Tenfen, Manuel de Freitas, Marcela Costa, Marcelo Passamai, Marcelo Spalding, Maria Aurora Carvalho Homem, Maria João Cantinho, Maria José Marques Figueiredo, Mariana Matos, Marie-Amélie Robilliard, Mário Cabral, Mário Lúcio Sousa, Mario Pirata, Marô (Maria Eunice) G. Barbieri, Monique Revillion, Nelson Saúte, Nuno Costa Santos, Nuno Moura, Olsen Jr., Onésimo Teotónio Almeida, Osmar Pisani, Paulo da Costa Domingos, Pedro Eiras, Pedro Fevereiro, Pedro Javier C. Garcia, Pedro Stiehl, Renata Correia Botelho, Renato Tapado, Ricardo Silvestrin, Rodrigo de Haro, Roger Cardús Juvé, Rogerio Manjate, Rogério Sousa, Rubem Penz, Rubens da Cunha, Rui Pires Cabral, Rui Sousa, Salomão Ribas Jr, Semy Braga, Sergio da Costa Ramos, Sidónio Bettencourt, Silveira de Souza, Sílvia Pinto Ferreira, Silvina Rodrigues Lopes, Sónia Bettencourt, Sulivan Bressan, Suzana Mafra, Tiago de Faria, Tiago Prenda Rodrigues, Tiago Rodrigues, Urbano Bettencourt, Valério Romão, Valesca de Assis, Vamberto Freitas, Victor Rui Dores, Vinícius Alves, Vítor Nogueira, Volnyr Santos, Walter Galvani e Zenilda Nunes Lins.

 

26/12/2011

QUANDO A ESTUPIDEZ ANDA À SOLTA

por cam

Perto do final do ano, como agora, costumo fazer planos para “furar” no ano que virá. Hoje, ocorreu-me que no passado também fiz projectos igualmente “furados”, estes não por mim, mas por terceiros, quantas vezes maldosamente – ou por simples estupidez e ignorância. É o caso, que inclui todos os epítetos descritos, dos Cadernos SIBIL, das Lajes do Pico. Enquanto trabalhei na Câmara, como coordenador da área cultural, criei alguns projectos editoriais. Este, o dos Cadernos SIBIL, fi-lo em colaboração com o José Augusto Soares. Os Cadernos eram dedicados à cultura baleeira e à biologia e ecologia dos grandes cetáceos, e era publicado sobre a égide do Centro de Artes e de Ciências do Mar, que concebi e instalei, na recuperada fábrica da baleia SIBIL (nome da sociedade antiga proprietária da fábrica de transformação de produtos do cachalote). Saiu em 2007 o primeiro e último número.

Direcção de Carlos Alberto Machado e José Augusto Soares